Richard Zimler: roteiro judeu em Portugal em 8 paragens
O conhecido romancista luso-americano, Richard Zimler, que cresceu numa família judia, vive em Lisboa e sugere, ao All About Portugal, um roteiro judeu pelo país.
Bastaram uns minutos de conversa sobre um roteiro judeu pelo país, para o All About Portugal iniciar uma surpreendente viagem no tempo, na História e por Portugal. O nosso guia foi o melhor de todos: Richard Zimler, jornalista, professor, curador e autor de inúmeros bestsellers por todo o mundo. Já publicou contos, escreveu guiões e livros para crianças – alguns deles fazem parte do Plano Nacional de Leitura em Portugal –, mas é como romancista que é mais conhecido.
Nascido nos Estados Unidos, cresceu no seio de uma família judaica e a cultura do seu povo e a sua história têm estado na base da maioria das suas publicações. Em 1990 instalou-se em Portugal – na altura no Porto – e o país, que é também o seu depois de mais de três décadas, serve-lhe igualmente de inspiração à escrita. "O Último Cabalista de Lisboa", o seu primeiro grande sucesso internacional, é um extraordinário romance histórico, e parte de um terrível episódio histórico ocorrido no país, em 1506: o massacre de cerca de 2000 cristãos-novos.
O All About Portugal esteve à conversa com o escritor, a viver em Lisboa desde 2015, que nos sugeriu oito sítios obrigatórios, para quem quer fazer um roteiro pelo judaísmo em Portugal. Junte-se a nós nesta descoberta e no fim, se ainda não o fez, mergulhe nos livros de Richard Zimler!
Teatro Nacional Dona Maria II
Situado no coração da capital, é um marco incontornável do judaísmo em Portugal. Este imponente edifício abria portas, enquanto teatro, em 1846 durante as comemorações do 27.º aniversário da rainha Maria II, a monarca que lhe dá nome. Nascia dos escombros do Palácio dos Estaús, que albergou monarcas e serviu como Tribunal da Inquisição, no século XV, e foi palco de torturas e de 20 mil conversões forçadas. “Com isso os judeus perderam a sua independência e, a verdade, é que o batismo forçado foi um desastre” esclarece Richard Zimler. Apesar da história passada, hoje acolhe espetáculos nacionais e estrangeiros e estimula a criação performativa.
Igreja de São Domingos
Fundada em 1242, e situada no interior das antigas muralhas de Lisboa, é uma das igrejas mais emblemáticas da cidade, e alia a sua beleza a um evento marcante em Portugal e que o bestseller de Richard Zimler "O Último Cabalista de Lisboa" traz ao de cima: o Massacre de Lisboa de 1506, quando cerca de dois mil cristãos-novos foram mortos e queimados, num triste episódio que fez deles bodes expiatórios da seca, da fome e da peste da época. Hoje encontramos, no largo em frente à Igreja, um Memorial às Vítimas do Massacre de 1506, uma obra de 2008, da autoria de Graça Bachmann, sob proposta da Comunidade Judaica.
Palácio da Inquisição / Centro de Arte e Cultura de Évora
Como o nome indica, serviu de quartel-general à Inquisição do século XVI e, apesar das diversas modificações arquitetónicas ao longos dos séculos, desta época destacam-se dois compartimentos, que ainda hoje se conservam, e que merecem a atenção do visitante: a Sala do Tribunal e o Cubículo do Inquisidor. O edifício tem cerca de três mil m2, compostos pelo Palácio da Inquisição, Centro de Arte e CulturaeCasas Pintadas, esta última com um exemplar único em Portugal de pintura mural palaciana, da segunda metade do século XVI. Apesar do passado sombrio é, hoje, palco de uma intensa promoção artística e cultural, com foco na Arte Contemporânea.
Sinagoga de Castelo de Vide
Aos olhos mais distraídos o pequeno prédio de dois andares, originalmente construído no século XIV, pode passar despercebido, mas esta é uma das duas sinagogas medievais restantes em Portugal. Mesmo depois da expulsão dos judeus portugueses pelo rei D. Manuel I, em 1496, os marranos continuaram a usar a sinagoga como santuário religioso e escola até o meio do século XVI. Terá posteriormente servido de residência privada e atualmente alberga um pequeno museu dedicado à história da comunidade judaica de Castelo de Vide.
Tomar e a Antiga Sinagoga
Tomar é uma cidade obrigatória, em qualquer roteiro judeu. Um dos seus ex-libris é a Sinagoga de Tomar um dos edifícios mais visitados da cidade e – tal como a de Castelo de Vide – uma das duas sinagogas medievais restantes em Portugal, sendo que esta é a única integralmente conservada. Esteve intimamente ligada ao movimento da comunidade judaica na cidade, que se teria estabelecido aqui, ao serviço da Ordem do Templo e, mais tarde, da sua sucessora, a Ordem de Cristo. Com a conversão forçada dos judeus, em 1496, foi encerrada e transformada em prisão. No século XIX foi palheiro, celeiro, armazém e adega. Em 1923, o edifício foi adquirido por Samuel Schwarz – um judeu polaco, investigador da cultura hebraica – e doada ao Estado para ali se criar o Museu Luso-Hebraico de Abraão Zacuto. O acervo do museu inclui livros e objetos da tradição e culto judaicos, assim como lápides provenientes de vários locais do país.
Sinagoga Shaare Tikvah
Foi a primeira sinagoga a ser construída de raiz em Portugal após a ordem de expulsão dos judeus de 1496, decretada pelo rei D. Manuel. Foi inaugurada em 1904 e na altura a lei estabelecia que os templos não católicos não poderiam ter a sua fachada para a rua, pelo que a sinagoga foi construída num pátio amuralhado. Em hebraico “Shaare Tikvah” significa "Portões da Esperança". Segue o rito sefardita do judaísmo e fica a dica: se a quer visitar tem de escrever com antecedência a pedir autorização.
Museu do Holocausto do Porto
Inaugurado em 2021, pela Comunidade Judaica do Porto, sensibiliza sobre um dos momentos mais negros da nossa História: o Holocausto. Com um espólio que junta documentos e os objetos deixados pelos refugiados na Sinagoga do Porto, durante a Segunda Guerra Mundial, o visitante poderá também ver a reprodução dos dormitórios de Auschwitz, fotografias e ecrãs exibindo filmes reais sobre o antes, o durante e o depois da tragédia, uma sala de nomes, um memorial da chama e não só!
Rua São Bento da Vitória
Situada no Centro Histórico do Porto, a sua história está intensamente ligada à história do judaísmo em Portugal e é um ponto obrigatório em qualquer roteiro judeu. Foi a mais famosa e última judiaria da cidade e existiu entre 1386 e 1496, sendo um verdadeiro gueto, que permita controlar a movimentação dos judeus. Depois de um período de desertificação – aquando da Inquisição – ganhou vida com o regresso dos cristãos-novos, no século XVI, e onde anteriormente estavam trinta casas da courela dos judeus, foi erguido o mosteiro de São Bento da Vitória, com a inscrição à entrada: “Aquela que foi sede das trevas é o palácio do sol. Expulsas as trevas, o sol beneditino triunfa“, o que levou historiadores a supor que teria sido aqui a Sinagoga.
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